Pelo menos 20 eleitores, dos 9.441 cadastrados pela Justiça Eleitoral em Lagoa Real (731 km de Salvador) têm menos de 16 anos de idade, portanto inaptos a votar nas eleições de 5 de outubro para prefeito e vereador.
A suspeita de fraude, que pode alcançar mais de 150 títulos ilegais no município é reforçada a partir do alistamento irregular da estudante Renara de Jesus Carvalho, cuja mãe, Ana Terezinha de Jesus, denunciou ter sido aliciada e orientada a alterar a certidão de nascimento da filha.
O objetivo era obter antecipadamente o título de eleitor para favorecer o vereador João Rodrigues Dias, 53 anos, que disputa sua quarta eleição para o mesmo cargo pelo DEM. Em declaração à Justiça, a mãe da adolescente acusa diretamente o vereador, afirmando que ele teria se apoderado do registro de nascimento da filha.
Falsificação - Nascida em 5 de dezembro de 1992, a garota só estaria apta a exercer o direito de voto após o dia 5 de dezembro deste ano, porém uma falsificação grosseira alterou a data de nascimento para 5 de setembro daquele ano, o que resultou na emissão do título eleitoral inscrito sob nº 135715600515.
A mãe, que reside na Fazenda Tanque do Governo, zona rural de Caetité, a mais de 50 km de Lagoa Real, só procurou a Justiça quando o caso ganhou repercussão. Temendo ser presa e ter a filha apreendida, a lavradora foi orientada a devolver o título eleitoral e denunciar à promotoria.
O vereador acusado, que concorre pela coligação "Paz e dignidade", formada pelo DEM, PC d B e PTN, nega as acusações, porém em determinado trecho da entrevista acaba se traindo. "Até agora não sei de nada, ainda não fui ouvido e só ouço comentários. Ninguém prova nada, porque apenas levo essas pessoas para tirar título".
A menor de idade, estudante do ensino fundamental, contesta o candidato e afirma que ele esteve em sua casa para intermediar a aquisição do título.
"Ele pediu meu registro e minha mãe deu, então se houve isso aí que estão dizendo, pode ter sido culpa dele ou dele com o pessoal do cartório", esquiva-se.
Renara afirmou que não pensou duas vezes porque, segundo a estudante, somente com o título é que poderia solicitar seu cartão de CPF. "Eu ia votar nele mesmo, mas agora quero fazer a coisa do jeito certo. Quando tiver idade certa eu mesmo vou fazer o título". Indagada sobre outros motivos que teriam levado o vereador a procurá-la, a garota disse desconhecer, mas deixou escapar que a rede de energia elétrica que chega até sua casa foi providenciada graças a ele.
Este, aliás, foi o único "benefício" para a família, que vive numa casa sem reboco, de chão batido e sem água encanada ou potável e longe dos serviços de saúde. "A energia foi ′seo′ Joãozinho que trouxe", assegurou, enquanto folheava os livros escolares. Mesmo que estivesse apta a votar, ela só poderia exercer esse direito em seu domicílio eleitoral, que é Caetité.
Apuração - O caso está sendo apurado pelo promotor de Justiça da 63ª Zona Eleitoral, Jailson Trindade. O vereador João Rodrigues Dias (DEM) deve ser investigado por crime de corrupção eleitoral e falsificação e adulteração de documento público.
Trindade não quis gravar entrevista, alegando que só se pronunciará após a conclusão dos trabalhos, que consiste em ouvir a garota e outros menores de idade já identificados, pais e o acusado de aliciamento.
Jornal A TARDE:24/09/2008